Investigadora da Escola Superior de Educação de Bragança estudou a utilização de audioguias nos museus
portugueses, nomeadamente no do Abade de Baçal. Poucos os usam, outros usam-nos, mas mal. A acessibilidade
a vários públicos tem muitas falhas. A investigação é pioneira e tem aplicação prática que traria vantagens a várias
instituições.
“Longe da vista perto da imaginação”- Análise de Audioguias em Museus Portugueses, é um estudo realizado por Cláudia Martins, docente da Escola Superior de Bragança (ESE) do IPB para conhecer a utilização destes pequenos aparelhos electrónicos portáteis que permitem fazer visitas personalizadas a instituições, em diversas línguas, com múltiplas descrições. Uma experiência auditiva que pode transportar ao passado, reforçar o presente ou antecipar o futuro.
Trata-se de um trabalho na área da Tradução Audiovisual, soluções de acessibilidade de tradução audiovisual, que é a audiodescrição. Pode resumir-se como uma técnica narrativa e descritiva que se desenvolveu mais nos aspectos relacionados com o cinema e que foi transportada para outros setores, como os museus. Os audioguias são ferramentas ou tecnologias que permitem veicular a audiodescrição.
Estudos de caso
A investigadora partiu de uma base teórica, mas assentou a sua tese em estudos de caso, numa aplicação prática, realizando um levantamento das ferramentas electrónicas usadas nos museus portugueses, cujos textos também analisou. Este é um dos raros estudos realizados em Portugal sobre este assunto, o último datava de 2010 e debruçava-se apenas sobre quatro casos. O da investigadora da ESE abrangeu 20 instituições. Concluiu que existem 83 audioguias, parte dos quais - 29 são só para excursões turística - e 54 para museus, num conjunto de 354 instituições referenciadas no país pelo INE, ainda que existam entre mil a mil e cem. Os audioguias podem ser aqui vistos como uma espécie de barómetro da acessibilidade. “Para além das visitas que fiz às instituições, analisei aos textos dos audioguias”, revelou Cláudia Martins.
O Museu do Abade de Baçal, em Bragança, foi um dos visitados por Cláudia Martins. O dignóstico, após a aplicação de uma grelha, que não abrange vários parâmetros, como a acessibilidade emocional, não é favorável, ainda que esteja em evolução.
“Tinha algumas falhas e não tinha condições gerais de acessibilidade, mas tem melhorado. Já dispõe de um tablet, que vem colmatar algumas críticas, sobretudo de estrangeiros, como a falta de informação noutros idiomas. Contudo tem falhas na questão dos textos, alguns são incoerentes e descritivos. Por outro lado, nem toda a gente sabe mexer neste tipo de tecnologia. Também utiliza uma voz sintetizada, o que causa estranhamento e consequente afastamento do seu uso”, referiu. A humanização dos textos é fundamental. “Uma voz simpática, várias em diálogo, contar a história de forma apelativa que nos toque, são estratégias mais sugestivas”, sublinhou a docente.
Com este estudo se demonstra também o grau de acessibilidade das instituições, pois é uma espécie de grelha de avaliação, “muito negativa”, garante.
Outra grande mais-valia desta tese é que mostra a realidade e a situação dos museus em Portugal.
Após a análise feita aos museus a conclusão não é animadora. “Há uma imensa falta de investimento na área da acessibilidade. Verifica-se um grande investimento na acessibilidade física, como nas rampas, casas de banho, mas esquecem a outra parte, que é algo transversal. O audioguia não tem de ser só para estrangeiros, podiam ser direcionados para invisuais ou pessoas com baixa visão, mas também para pessoas com menos experiência em museus, idosos, emigrantes, pessoas com dificuldades cognitivas ou sensoriais”, indicou. Os audioguias podem ter vantagens para uma boa parte do público.
“Em diversas ocasiões, quando nas instituições eu solicitava um audioguia perguntavam- me para que o queria se era portuguesa?”, recordou ao Mensageiro.
São poucos os museus com audioguias
Os únicos museus que disponibilizam audioguias para cegos ou pessoas com baixa visão são o Museu da Comunidade Concelhia da Batalha e o Museu Nacional do Azulejo, ambos com projetos realizados por Josélia Neves, que orientou a investigação de Cláudia Martins. “Todos os outros têm audioguias de uma natureza muito erudita. Não servem todos os públicos, seja ao nível da sensibilidade sensorial, seja de acessibilidade de informação. São muito fechados, muito intelectuais, com textos muito herméticos e muito opacos”, descreveu a docente. As instituições que investem nestes recursos normalmente fazem-no porque têm muitos visitantes estrangeiros. Podem ainda ser uma alternativa a visitas guiadas, por serem instrumentos de mediação, e uma outra resposta às tradicionais legendas ou informação escrita, mas não têm que ser a única forma disponível.
Debruçou-se ainda sobre a linguagem, se é técnica ou não, se fazem uso de música, vozes reais e outros parâmetros. “Tudo isto bem conjugado pode ser vantajoso. Mas o paradigma de audioguia que temos é muito fechado e extremamente erudito. Acabam por ser a reprodução”, notou. Muitos potenciais visitantes “não sentem esta acessibilidade geral”, acrescentou.
A tese já foi considerada um marco nesta área e haveria vantagens em ser avaliada pelos responsáveis pelas instituições de modo a ser aplicada. Tanto mais que não existia um estudo tão completo a nível nacional, sobre o assunto pelo menos de um modo tão exaustivo.
Publicado em 'Mensageiro'.
“Longe da vista perto da imaginação”- Análise de Audioguias em Museus Portugueses, é um estudo realizado por Cláudia Martins, docente da Escola Superior de Bragança (ESE) do IPB para conhecer a utilização destes pequenos aparelhos electrónicos portáteis que permitem fazer visitas personalizadas a instituições, em diversas línguas, com múltiplas descrições. Uma experiência auditiva que pode transportar ao passado, reforçar o presente ou antecipar o futuro.
Trata-se de um trabalho na área da Tradução Audiovisual, soluções de acessibilidade de tradução audiovisual, que é a audiodescrição. Pode resumir-se como uma técnica narrativa e descritiva que se desenvolveu mais nos aspectos relacionados com o cinema e que foi transportada para outros setores, como os museus. Os audioguias são ferramentas ou tecnologias que permitem veicular a audiodescrição.
Estudos de caso
A investigadora partiu de uma base teórica, mas assentou a sua tese em estudos de caso, numa aplicação prática, realizando um levantamento das ferramentas electrónicas usadas nos museus portugueses, cujos textos também analisou. Este é um dos raros estudos realizados em Portugal sobre este assunto, o último datava de 2010 e debruçava-se apenas sobre quatro casos. O da investigadora da ESE abrangeu 20 instituições. Concluiu que existem 83 audioguias, parte dos quais - 29 são só para excursões turística - e 54 para museus, num conjunto de 354 instituições referenciadas no país pelo INE, ainda que existam entre mil a mil e cem. Os audioguias podem ser aqui vistos como uma espécie de barómetro da acessibilidade. “Para além das visitas que fiz às instituições, analisei aos textos dos audioguias”, revelou Cláudia Martins.
O Museu do Abade de Baçal, em Bragança, foi um dos visitados por Cláudia Martins. O dignóstico, após a aplicação de uma grelha, que não abrange vários parâmetros, como a acessibilidade emocional, não é favorável, ainda que esteja em evolução.
“Tinha algumas falhas e não tinha condições gerais de acessibilidade, mas tem melhorado. Já dispõe de um tablet, que vem colmatar algumas críticas, sobretudo de estrangeiros, como a falta de informação noutros idiomas. Contudo tem falhas na questão dos textos, alguns são incoerentes e descritivos. Por outro lado, nem toda a gente sabe mexer neste tipo de tecnologia. Também utiliza uma voz sintetizada, o que causa estranhamento e consequente afastamento do seu uso”, referiu. A humanização dos textos é fundamental. “Uma voz simpática, várias em diálogo, contar a história de forma apelativa que nos toque, são estratégias mais sugestivas”, sublinhou a docente.
Com este estudo se demonstra também o grau de acessibilidade das instituições, pois é uma espécie de grelha de avaliação, “muito negativa”, garante.
Outra grande mais-valia desta tese é que mostra a realidade e a situação dos museus em Portugal.
Após a análise feita aos museus a conclusão não é animadora. “Há uma imensa falta de investimento na área da acessibilidade. Verifica-se um grande investimento na acessibilidade física, como nas rampas, casas de banho, mas esquecem a outra parte, que é algo transversal. O audioguia não tem de ser só para estrangeiros, podiam ser direcionados para invisuais ou pessoas com baixa visão, mas também para pessoas com menos experiência em museus, idosos, emigrantes, pessoas com dificuldades cognitivas ou sensoriais”, indicou. Os audioguias podem ter vantagens para uma boa parte do público.
“Em diversas ocasiões, quando nas instituições eu solicitava um audioguia perguntavam- me para que o queria se era portuguesa?”, recordou ao Mensageiro.
São poucos os museus com audioguias
Os únicos museus que disponibilizam audioguias para cegos ou pessoas com baixa visão são o Museu da Comunidade Concelhia da Batalha e o Museu Nacional do Azulejo, ambos com projetos realizados por Josélia Neves, que orientou a investigação de Cláudia Martins. “Todos os outros têm audioguias de uma natureza muito erudita. Não servem todos os públicos, seja ao nível da sensibilidade sensorial, seja de acessibilidade de informação. São muito fechados, muito intelectuais, com textos muito herméticos e muito opacos”, descreveu a docente. As instituições que investem nestes recursos normalmente fazem-no porque têm muitos visitantes estrangeiros. Podem ainda ser uma alternativa a visitas guiadas, por serem instrumentos de mediação, e uma outra resposta às tradicionais legendas ou informação escrita, mas não têm que ser a única forma disponível.
Debruçou-se ainda sobre a linguagem, se é técnica ou não, se fazem uso de música, vozes reais e outros parâmetros. “Tudo isto bem conjugado pode ser vantajoso. Mas o paradigma de audioguia que temos é muito fechado e extremamente erudito. Acabam por ser a reprodução”, notou. Muitos potenciais visitantes “não sentem esta acessibilidade geral”, acrescentou.
A tese já foi considerada um marco nesta área e haveria vantagens em ser avaliada pelos responsáveis pelas instituições de modo a ser aplicada. Tanto mais que não existia um estudo tão completo a nível nacional, sobre o assunto pelo menos de um modo tão exaustivo.
Publicado em 'Mensageiro'.
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