"Tenho a certeza de que se fizermos um ranking muitos politécnicos vão ocupar posições surpreendentes. Em Portugal, o pior ranking que existe é o das perceções"
"No estrangeiro ninguém me pergunta a que distância estou de Lisboa, mas qual a qualidade da instituição e da cidade. E nós temos respostas"
Espalhados um pouco por todo o país, os institutos politécnicos têm contribuído de forma determinante para o desenvolvimento das regiões, diz Sobrinho Teixeira, presidente do Politécnico de Bragança. Por isso, opõe-se à redução da rede. E acredita que no dia em que houver rankings destas instituições, os politécnicos vão surpreender. Nos dois últimos dias discutiram o futuro em congresso, no Porto.
P: Várias instituições têm alertado para um aumento do abandono no ensino superior por razões económicas. Confirma?
R: Os dados que temos são do início de fevereiro e não indicam aumento de desistências. No Politécnico de Bragança temos até duas dezenas de abandonos a menos face ao ano transato. A verdade é que todos os anos há variações desta ordem, que têm que ver com razões muito diversas da situação de cada aluno. Pode ser que se venha a verificar algum atraso no pagamento das propinas agora no segundo semestre, mas não sabemos ainda.
P: As denúncias são alarmistas?
R: Eu estou a falar da realidade do ensino politécnico. Este sistema tem particularidades que se calhar o tornam menos vulnerável à crise. A sua localização geográfica abrange 41 concelhos. Na maior parte das vezes, o aluno encontra-se no ambiente familiar. E muitos dos que estão deslocados estudam em politécnicos fora das grandes cidades, onde os custos de vida são muito mais baixos (o custo de acomodação em Bragança é cerca de um quarto do de Lisboa).
P: Num cenário de contenção financeira, essa dispersão não é uma desvantagem?
R: As vantagens superam largamente as desvantagens. Os politécnicos têm tido um grande contributo para a qualificação dos portugueses e para a coesão nacional. Hoje, um jovem de uma aldeia de Bragança tem a mesma oportunidade de se qualificar do que um jovem do centro de Lisboa. E o impacto no desenvolvimento das regiões sente-se a todos os níveis.
P: O interior estaria ainda mais abandonado?
R: Não seria possível haver teatro ou espetáculos culturais em Bragança se não houvesse o politécnico, que tem 7500 alunos numa cidade de 23.500 habitantes. O politécnico contribui para a coesão económica da região, mas também social e cultural.
P: A questão é saber se há dinheiro para manter essa rede.
R: Se somarmos o Orçamento do Estado atribuído aos sete politécnicos do interior, isso corresponde a 9,1% do total que o Estado gasta no ensino superior. Parece-me que o contributo destes politécnicos para a sustentabilidade das regiões vale muito mais do que isso. Há um estudo que analisa o impacto económico dos politécnicos do interior nas respetivas cidades e que conclui que por cada euro que o Estado investe num aluno de uma instituição no interior há um retomo de €2,33 em cobrança de impostos. Se o país tivesse um universo maior de pessoas qualificadas talvez os sacrifícios que estão hoje a ser pedidos aos portugueses fossem menores. Não é à custa das pessoas que recebem o salário mínimo que o país vai cobrar impostos que permitam sair da crise.
P: Mas o facto de haver 15 institutos politécnicos não os impede de ganhar dimensão?
R: Por isso defendemos a constituição de consórcios que respeitem a autonomia de cada instituição mas que permitam ganhar dimensão e capacidade de realizar projetos. Há já vários exemplos. Na região Norte os quatro politécnicos associaram-se para oferecer formação conjunta e estão a dar sete mestrados, que funcionam alternadamente nos institutos, em vez de os repetirem em cada um.
P: Esse esforço não se nota ainda nas licenciaturas. Só na rede pública existem 1200, metade das quais nos politécnicos.
R: Concordo que existem cursos a mais, mas acho que existe ensino superior a menos. A população ativa portuguesa com qualificação superior é cerca de metade da realidade da OCDE. O esforço que tem de ser feito não pode ser no sentido de reduzir o sistema mas de tornar a oferta mais eficaz, garantindo a qualificação de mais pessoas.
P: Se as instituições não se puserem de acordo, teme que o Ministério decida por elas?
R: O Governo dirá quais as linhas - já foi dito que é preciso reorganizar a rede de cursos, tendo em conta a sua qualidade e a oferta repetida na mesma área geográfica. Mas estou convencido de que esse trabalho vai ser feito com as instituições.
P: Em Espanha, o Governo vai permitir o aumento de propinas até 50%. O Governo português pode seguir o mesmo caminho?
R: Esse deve ser o último dos caminhos. Numa situação de crise, afastaria ainda mais gente do ensino superior. A Noruega, que é um país muito desenvolvido, também teve de adaptar o seu orçamento: cortou em tudo menos no superior e investigação, pois é isso que garante o futuro.
Publicado em 'Expresso'.
"No estrangeiro ninguém me pergunta a que distância estou de Lisboa, mas qual a qualidade da instituição e da cidade. E nós temos respostas"
Espalhados um pouco por todo o país, os institutos politécnicos têm contribuído de forma determinante para o desenvolvimento das regiões, diz Sobrinho Teixeira, presidente do Politécnico de Bragança. Por isso, opõe-se à redução da rede. E acredita que no dia em que houver rankings destas instituições, os politécnicos vão surpreender. Nos dois últimos dias discutiram o futuro em congresso, no Porto.
P: Várias instituições têm alertado para um aumento do abandono no ensino superior por razões económicas. Confirma?
R: Os dados que temos são do início de fevereiro e não indicam aumento de desistências. No Politécnico de Bragança temos até duas dezenas de abandonos a menos face ao ano transato. A verdade é que todos os anos há variações desta ordem, que têm que ver com razões muito diversas da situação de cada aluno. Pode ser que se venha a verificar algum atraso no pagamento das propinas agora no segundo semestre, mas não sabemos ainda.
P: As denúncias são alarmistas?
R: Eu estou a falar da realidade do ensino politécnico. Este sistema tem particularidades que se calhar o tornam menos vulnerável à crise. A sua localização geográfica abrange 41 concelhos. Na maior parte das vezes, o aluno encontra-se no ambiente familiar. E muitos dos que estão deslocados estudam em politécnicos fora das grandes cidades, onde os custos de vida são muito mais baixos (o custo de acomodação em Bragança é cerca de um quarto do de Lisboa).
P: Num cenário de contenção financeira, essa dispersão não é uma desvantagem?
R: As vantagens superam largamente as desvantagens. Os politécnicos têm tido um grande contributo para a qualificação dos portugueses e para a coesão nacional. Hoje, um jovem de uma aldeia de Bragança tem a mesma oportunidade de se qualificar do que um jovem do centro de Lisboa. E o impacto no desenvolvimento das regiões sente-se a todos os níveis.
P: O interior estaria ainda mais abandonado?
R: Não seria possível haver teatro ou espetáculos culturais em Bragança se não houvesse o politécnico, que tem 7500 alunos numa cidade de 23.500 habitantes. O politécnico contribui para a coesão económica da região, mas também social e cultural.
P: A questão é saber se há dinheiro para manter essa rede.
R: Se somarmos o Orçamento do Estado atribuído aos sete politécnicos do interior, isso corresponde a 9,1% do total que o Estado gasta no ensino superior. Parece-me que o contributo destes politécnicos para a sustentabilidade das regiões vale muito mais do que isso. Há um estudo que analisa o impacto económico dos politécnicos do interior nas respetivas cidades e que conclui que por cada euro que o Estado investe num aluno de uma instituição no interior há um retomo de €2,33 em cobrança de impostos. Se o país tivesse um universo maior de pessoas qualificadas talvez os sacrifícios que estão hoje a ser pedidos aos portugueses fossem menores. Não é à custa das pessoas que recebem o salário mínimo que o país vai cobrar impostos que permitam sair da crise.
P: Mas o facto de haver 15 institutos politécnicos não os impede de ganhar dimensão?
R: Por isso defendemos a constituição de consórcios que respeitem a autonomia de cada instituição mas que permitam ganhar dimensão e capacidade de realizar projetos. Há já vários exemplos. Na região Norte os quatro politécnicos associaram-se para oferecer formação conjunta e estão a dar sete mestrados, que funcionam alternadamente nos institutos, em vez de os repetirem em cada um.
P: Esse esforço não se nota ainda nas licenciaturas. Só na rede pública existem 1200, metade das quais nos politécnicos.
R: Concordo que existem cursos a mais, mas acho que existe ensino superior a menos. A população ativa portuguesa com qualificação superior é cerca de metade da realidade da OCDE. O esforço que tem de ser feito não pode ser no sentido de reduzir o sistema mas de tornar a oferta mais eficaz, garantindo a qualificação de mais pessoas.
P: Se as instituições não se puserem de acordo, teme que o Ministério decida por elas?
R: O Governo dirá quais as linhas - já foi dito que é preciso reorganizar a rede de cursos, tendo em conta a sua qualidade e a oferta repetida na mesma área geográfica. Mas estou convencido de que esse trabalho vai ser feito com as instituições.
P: Em Espanha, o Governo vai permitir o aumento de propinas até 50%. O Governo português pode seguir o mesmo caminho?
R: Esse deve ser o último dos caminhos. Numa situação de crise, afastaria ainda mais gente do ensino superior. A Noruega, que é um país muito desenvolvido, também teve de adaptar o seu orçamento: cortou em tudo menos no superior e investigação, pois é isso que garante o futuro.
Publicado em 'Expresso'.
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