Politécnicos querem atribuir doutoramentos profissionais e mudar a designação para universidades de ciências aplicadas.
Os politécnicos portugueses
pedem duas coisas fundamentais
ao Governo: querem
atribuir doutoramentos
e alterar o seu nome
para universidades de
ciências aplicada, como se
designam na maioria dos outros países europeus.
As duas reivindicações foram apresentadas
ao Diário Económico por Joaquim Mourato,
o presidente do CCISP–Conselho Coordenador
dos Institutos Superiores Politécnicos – após
uma reunião europeia que trouxe a Lisboa cerca
de 200 representantes das instituições equivalentes de outros
países da Europa.
Joaquim Mourato explica, primeiro que tudo,
porque faz sentido incluir o doutoramento nos
politécnicos. “Devem existir no ensino de cariz
profissionalizante todos os níveis de Bolonha,
desde o ciclo mais curto até ao doutoramento de
natureza profissional. Temos bons exemplos na
Europa e no mundo. Para fazermos investigação
aplicada, temos de ter formação avançada a nível
de mestrado e doutoramento”, defende.
O presidente do CCISP, que é presidente do
Politécnico de Portalegre, foi o anfitrião do encontro
europeu, onde foram apresentadas as recomendações
e linhas de orientação da European
Association of Institutions in Higher Education
(EURASHE) – que reúne as instituições
de ensino superior de cariz profissionalizante da
Europa, ou seja, equivalentes aos politécnicos
portugueses – para levar ao encontro de ministros
europeus da Educação que vai decorrer já
em Maio, na capital de Yerevan, na Arménia.
Será ainda levada aos ministros a necessidade
de aumentar as parcerias entre estas instituições
de ensino e as empresas. E aqui não são só
as empresas que têm de responder ao apelo, mas
também “tem de ser um propósito do próprio
Governo”, sublinha este responsável. “É importante que as empresas
participem, desde logo, na
organização dos currículos dos próprios cursos”,
defende Joaquim Mourato, para quem é essencial
uma ligação profunda, com as aulas muito
orientadas para as profissões e comum envolvimento
muito grande das empresas. Até porque
assim, defende, poderá também resultar com
maior sucesso a investigação aplicada.
Apoiar empresas que integrem
os estudantes
Esta ligação estreita com as empresas é a maior
aliada da empregabilidade, em seu entender. “É
a maior garantia que damos aos estudantes de
poderem adquirir as competências adequadas
para o mercado de trabalho. E, por outro lado, a
garantia de que terão o primeiro contacto directo com o mercado de
trabalho”, sublinha o presidente do CCISP.
Joaquim Mourato avança mesmo com uma
sugestão para o Governo português: “Temos um
novo QCA, que pode ser muito útil na integração
dos jovens no mercado de trabalho. As empresas
seriam apoiadas para empregar os estudantes
nos primeiros seis ou 12 meses de inserção no
mercado de trabalho. Era uma forma muito interessante
de ajudar esta articulação”, acrescenta
o responsável.
A recomendação é clara e é levada pela EURASHE
ao encontro dos ministros do próximo
mês: só com maior ligação às empresas se aproximará o ensino das necessidades do mercado de
trabalho, ao mesmo tempo que se promove a
empregabilidade dos recém-graduados, assim
como a formação ao longo da vida, de forma a garantir
profissionais competentes e adaptados às
necessidades do mercado.
Joaquim Mourato apela ainda ao apoio da
Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) a
centros de investigação aplicada, com outros critérios
de atribuição que não os que avaliam a
produção científica. Critérios que avaliem a
transferência de tecnologia para as empresas, os
resultados do trabalho dessa investigação para
as mesmas, o impacto regional, etc. Ou seja, avaliar
a actividade das instituições com outros indicadores.
Andreas Orphanides, presidente da EURASHE,
referiu, na conferência de Lisboa, que “é
importante definir o futuro, com investigação e
criatividade, de forma a identificar soluções”,
defendendo o potencial de uma “participação
interdisciplinar” entre todos.
“Defendemos
a junção dos
politécnicos”
Joaquim Mourato, o presidente do conselho
coordenador dos politécnicos portugueses,
vê com bons olhos a fusão de instituições
e reorganização da rede de politécnicos,
sempre em colaboração com as empresas
e com um projecto educativo virado para as suas
necessidades, com uma forte aposta regional. Só
que o Governo não mostrou abertura para tal
proposta do CCISP. Entretanto, os politécnicos
reclamam 200 milhões de euros de reposição do
Orçamento de Estado. E dizem que o ‘deadline’
está a chegar, porque não têm dinheiro para pagar
os subsídios de férias.
Qual é o país que os politécnicos portugueses
consideram como modelo bem sucedido
na forma como engloba o ensino profissionalizante no superior?
O modelo irlandês. Os institutos tecnológicos na
Irlanda estão a conferir o grau de doutoramento
e têm uma relação muito boa, muito próxima
com as empresas. É um modelo que está muito
bem desenvolvido, com óptimos resultados. Os
13 institutos tecnológicos na Irlanda, equivalentes
aos nossos politécnicos, são hoje universidades
tecnológicas, juntaram-se dois a dois ou três
a três e desenharam projectos educativos conjuntos.
Nós também já lançámos essa proposta
em Portugal. A junção de dois ou três politécnicos
para se transformarem numa universidade
tecnológica com um projecto muito próximo de
trabalho de colaboração com empresas identificadas
nas respectivas regiões,com oferta formativa
muito direccionada para as necessidades
dessas empresas e com oferta até ao grau de doutoramento profissional.
Quer dizer que vê com bons olhos a fusão de
politécnicos em Portugal?
O CCISP apresentou essa proposta e já a referi
por várias vezes. Estou na disponibilidade de
olhar para um projecto desse tipo, para a reorganização
de algumas instituições, dentro da sua
autonomia, comum projecto educativo comum,
que teria outras ambições e posicionamento. É
razoável e desejável que isso aconteça, mas nunca
houve abertura do Governo para avançar. Várias
instituições já se concertaram nesse sentido,
mas esse tipo de projecto não foi aceite.
Como estão a viver os politécnicos os constrangimentos
orçamentais deste ano?
Estimamos em 20 milhões de euros a verba de
que necessitamos, como resultado do impacto
da decisão do Tribunal Constitucional e das alterações
introduzidas na Lei do OE. Mais mês,
menos mês, vamos ter problemas e o ‘deadline’
está a chegar. Não teremos capacidade para pagar
os subsídios de férias.
Publicado em 'Diário Económico Nº 6155 | 20 Abril 2015'.