Uma docente da Escola Superior de Saúde de Bragança (ESSB), Eugénia Mendes, concluí que existe uma “relação estatisticamente significativa” entre o tipo de sorriso e a atribuição de competências aos profissionais de saúde, verificando-se médias mais elevadas para as competências relacionais e de comunicação interpessoal do que para as competências afectivas.
Esta foi uma das conclusões do Estudo “Efeitos do Sorriso na Atribuição de Competências aos Profissionais de Saúde”, realizado no âmbito de uma tese de mestrado na Universidade Fernando Pessoa, conduzido por Eugénia Mendes.
A investigação tomou como amostra 265 participantes, jovens, adultos e crianças. Cerca de dois terços são de Bragança, mas há uma faixa etária (idosos) cuja maioria é do Porto.
Pediu-se aos participantes que efectuassem uma escolha de entre sete fotos que representavam as versões “sem sorriso”, “sorriso fechado/superior”, “sorriso longo verdadeiro”, e “sorriso falso” por cada um dos grupos profissionais estudados: enfermeiros, médicos, e psicólogos.
Eugénia Mendes explicou a O INFORMATIVO que os profissionais de saúde necessitam de estabelecer com os seus clientes uma relação que facilite o sucesso do encontro terapêutico. “A qualidade desta relação será determinante para que o cliente possa em conjunto com o técnico desenvolver as operações e mecanismos necessários à manutenção ou recuperação da saúde o mais rapidamente possível”, referiu.
Neste contexto existe a necessidade de estabelecer com o outro uma relação que permita a partilha de informação na maioria das vezes de foro íntimo. “Falamos da exposição do corpo mas também de expor vivências, sentimentos e emoções”, justificou. O elo que liga o profissional ao cliente fica profunda e muitas vezes indelevelmente marcado pelo primeiro contacto. “A primeira “leitura” do outro inicia-se no preciso instante em que as mensagens não verbais do corpo, e principalmente da face, são captadas pelo receptor e determinam a disponibilidade para a relação. Os sinais não-verbais podem afastar-nos ou pelo contrário produzir uma identificação e aproximação imediatas ou seja, o sentir que podemos criar laços”, acrescentou.
Sorriso ajuda na relação
A decisão de estudar o sorriso está relacionada com um episódio que observou há18 anos. “Eu estava a acompanhar a minha mãe, que estava internada num serviço de urgência, e na cama ao lado estava uma velhinha. Quando a enfermeira iniciou o seu turno veio à enfermaria, inteirou-se da situação da minha mãe e depois dirigiu-se à velhinha, inclinou-se sobre ela, tocou-lhe a mão, sorriu e perguntou " A senhora precisa de alguma coisa?". Achou a resposta absolutamente surpreendente: "Agora já não preciso de nada. Só precisava de um agrado e a menina já mo deu. Depois, virou-se para nós e disse a mim podem-me estar a matar mas se for com agrado", explicou Eugénia Mendes.
Esta situação despertou-lhe o interesse e começou a reflectir. Sabendo que era a primeira vez que aquelas pessoas se encontravam o que determinou aquele grau de confiança na enfermeira? O que produziu aquele estado de bem-estar? Todas as respostas apontam para a comunicação não verbal. Mas, qual dos sinais não verbais (proximidade, toque, tom de voz, expressão facial) teria sido mais imediato e mais determinante?
O estudo analisa que na formação de impressões, o primeiro contacto, e a primeira leitura do outro, são determinantes para o sucesso da relação e facilitadores de todo o processo terapêutico. “Não são necessários muitos itens informativos para formar uma impressão complexa e detalhada quando a pessoa que observamos pertence a um determinado grupo profissional. O conhecimento prévio da profissão do indivíduo que permite que ao interpretar os sinais não verbais em geral e o sorriso em particular, possamos evocar o estereótipo associado a essa profissão e rotulá-lo e catalogá-lo”, justificou.
Aos inquiridos foi solicitado que se colocassem na situação em que iam ser atendidos por um profissional de saúde, após o que lhe era mostrado um quadro com fotografias de indivíduos que representavam o profissional a analisar (enfermeiro, médico ou psicólogo) apresentando vários tipos de sorriso. Pedia-se que escolhessem quem preferiam para tratar de si. Os resultados do estudo reflectem diferentes escolhas para os grupos profissionais em análise em função do que os inquiridos entenderam ser o que melhor serviria os seus interesses.
Para os enfermeiros foi escolhido o sorriso fechado (sem abertura dos lábios) que está descrito como o mais afectivo. “A afectividade facilita a interacção social, e permite a proximidade inter pessoal. Esta escolha poderá ser explicada pelas características próprias da profissão que privilegia a relação de proximidade e parceria com a pessoa”, esclareceu. Nos momentos de maior fragilidade do doente os enfermeiros são o grupo profissional mais próximo “e são preferidos aqueles que demonstram ser mais afectivos”.
No caso dos médicos foi escolhido o sorriso superior (lábios entreabertos). Os médicos assumem uma posição dominante no âmbito das profissões de saúde que tem sido tradicional e culturalmente marcante. “Encontrámos aqui uma aparente dissonância face à literatura consultada que refere que os indivíduos em posição dominante sorriem menos”, salientou. Foi pedido aos participantes que escolhessem em função do que entendiam ser o que melhor servisse os seus interesses de cliente/utilizador de cuidados. “Acredito que a escolha do sorriso superior pode ser explicada pela escolha de um tipo de sorriso que indiciasse maior proximidade, menos tensão e menor demonstração de status”, aponta. Eugénia Mendes considera que pode ser verificado outro motivo que se prende com a auto-protecção: “são os médicos que transmitem aos doentes o veredicto (diagnóstico e prognóstico) e ninguém exibirá um sorriso superior para transmitir más notícias”.
No caso dos psicólogos, os resultados mostraram diferenças entre os géneros dos profissionais (sem sorriso para homens e fechado para mulheres). Esse facto pode ser explicado pelo pouco contacto referido pelos participantes com este grupo profissional (mais de 50% nunca tinha tido contacto), centrando-se a expectativa nas diferenças esperadas relativas apenas ao género dos psicólogos. “A literatura é unânime no reconhecimento de uma maior frequência na emissão de sorriso por parte das mulheres e do seu uso mais contido e controlado por parte dos homens. Este comportamento esperado para o género pode ter determinado estas escolhas”. Esta é uma área profissional em que a pessoa expõe a sua intimidade, assumindo que o corpo será a parte mais pública da nossa identidade, a face neutra ou um sorriso mais empático e afectuoso é preferido a manifestações mais enfáticas”, explicou.
Dissecar assim o sorriso dos profissionais de saúde pode ter aplicação prática, tanto mais que a comunicação não verbal, é uma ferramenta de trabalho poderosíssima. “Como o uso de qualquer ferramenta, pode ser aprendida e treinada”, garante a investigadora, que acrescenta: “sabemos que o que dizemos às pessoas é importante mas também sabemos que mais importante é a forma como dizemos e a congruência que colocamos no acto de comunicar”.
Se um primeiro contacto se iniciar com o sorriso estará a transmitir-se ao doente a certeza de que há disponibilidade para uma relação de proximidade, “que terminará certamente, numa relação terapêutica eficaz com menor ansiedade e maior adesão ao plano terapêutico”, justifica. Ora isto poderá traduzir-se em coisas concretas “como por exemplo menos dor, menos complicações pós-operatórias, menos medicamentos ou altas mais precoces”.
Publicado em 'O Informativo'.
Esta foi uma das conclusões do Estudo “Efeitos do Sorriso na Atribuição de Competências aos Profissionais de Saúde”, realizado no âmbito de uma tese de mestrado na Universidade Fernando Pessoa, conduzido por Eugénia Mendes.
A investigação tomou como amostra 265 participantes, jovens, adultos e crianças. Cerca de dois terços são de Bragança, mas há uma faixa etária (idosos) cuja maioria é do Porto.
Pediu-se aos participantes que efectuassem uma escolha de entre sete fotos que representavam as versões “sem sorriso”, “sorriso fechado/superior”, “sorriso longo verdadeiro”, e “sorriso falso” por cada um dos grupos profissionais estudados: enfermeiros, médicos, e psicólogos.
Eugénia Mendes explicou a O INFORMATIVO que os profissionais de saúde necessitam de estabelecer com os seus clientes uma relação que facilite o sucesso do encontro terapêutico. “A qualidade desta relação será determinante para que o cliente possa em conjunto com o técnico desenvolver as operações e mecanismos necessários à manutenção ou recuperação da saúde o mais rapidamente possível”, referiu.
Neste contexto existe a necessidade de estabelecer com o outro uma relação que permita a partilha de informação na maioria das vezes de foro íntimo. “Falamos da exposição do corpo mas também de expor vivências, sentimentos e emoções”, justificou. O elo que liga o profissional ao cliente fica profunda e muitas vezes indelevelmente marcado pelo primeiro contacto. “A primeira “leitura” do outro inicia-se no preciso instante em que as mensagens não verbais do corpo, e principalmente da face, são captadas pelo receptor e determinam a disponibilidade para a relação. Os sinais não-verbais podem afastar-nos ou pelo contrário produzir uma identificação e aproximação imediatas ou seja, o sentir que podemos criar laços”, acrescentou.
Sorriso ajuda na relação
A decisão de estudar o sorriso está relacionada com um episódio que observou há18 anos. “Eu estava a acompanhar a minha mãe, que estava internada num serviço de urgência, e na cama ao lado estava uma velhinha. Quando a enfermeira iniciou o seu turno veio à enfermaria, inteirou-se da situação da minha mãe e depois dirigiu-se à velhinha, inclinou-se sobre ela, tocou-lhe a mão, sorriu e perguntou " A senhora precisa de alguma coisa?". Achou a resposta absolutamente surpreendente: "Agora já não preciso de nada. Só precisava de um agrado e a menina já mo deu. Depois, virou-se para nós e disse a mim podem-me estar a matar mas se for com agrado", explicou Eugénia Mendes.
Esta situação despertou-lhe o interesse e começou a reflectir. Sabendo que era a primeira vez que aquelas pessoas se encontravam o que determinou aquele grau de confiança na enfermeira? O que produziu aquele estado de bem-estar? Todas as respostas apontam para a comunicação não verbal. Mas, qual dos sinais não verbais (proximidade, toque, tom de voz, expressão facial) teria sido mais imediato e mais determinante?
O estudo analisa que na formação de impressões, o primeiro contacto, e a primeira leitura do outro, são determinantes para o sucesso da relação e facilitadores de todo o processo terapêutico. “Não são necessários muitos itens informativos para formar uma impressão complexa e detalhada quando a pessoa que observamos pertence a um determinado grupo profissional. O conhecimento prévio da profissão do indivíduo que permite que ao interpretar os sinais não verbais em geral e o sorriso em particular, possamos evocar o estereótipo associado a essa profissão e rotulá-lo e catalogá-lo”, justificou.
Aos inquiridos foi solicitado que se colocassem na situação em que iam ser atendidos por um profissional de saúde, após o que lhe era mostrado um quadro com fotografias de indivíduos que representavam o profissional a analisar (enfermeiro, médico ou psicólogo) apresentando vários tipos de sorriso. Pedia-se que escolhessem quem preferiam para tratar de si. Os resultados do estudo reflectem diferentes escolhas para os grupos profissionais em análise em função do que os inquiridos entenderam ser o que melhor serviria os seus interesses.
Para os enfermeiros foi escolhido o sorriso fechado (sem abertura dos lábios) que está descrito como o mais afectivo. “A afectividade facilita a interacção social, e permite a proximidade inter pessoal. Esta escolha poderá ser explicada pelas características próprias da profissão que privilegia a relação de proximidade e parceria com a pessoa”, esclareceu. Nos momentos de maior fragilidade do doente os enfermeiros são o grupo profissional mais próximo “e são preferidos aqueles que demonstram ser mais afectivos”.
No caso dos médicos foi escolhido o sorriso superior (lábios entreabertos). Os médicos assumem uma posição dominante no âmbito das profissões de saúde que tem sido tradicional e culturalmente marcante. “Encontrámos aqui uma aparente dissonância face à literatura consultada que refere que os indivíduos em posição dominante sorriem menos”, salientou. Foi pedido aos participantes que escolhessem em função do que entendiam ser o que melhor servisse os seus interesses de cliente/utilizador de cuidados. “Acredito que a escolha do sorriso superior pode ser explicada pela escolha de um tipo de sorriso que indiciasse maior proximidade, menos tensão e menor demonstração de status”, aponta. Eugénia Mendes considera que pode ser verificado outro motivo que se prende com a auto-protecção: “são os médicos que transmitem aos doentes o veredicto (diagnóstico e prognóstico) e ninguém exibirá um sorriso superior para transmitir más notícias”.
No caso dos psicólogos, os resultados mostraram diferenças entre os géneros dos profissionais (sem sorriso para homens e fechado para mulheres). Esse facto pode ser explicado pelo pouco contacto referido pelos participantes com este grupo profissional (mais de 50% nunca tinha tido contacto), centrando-se a expectativa nas diferenças esperadas relativas apenas ao género dos psicólogos. “A literatura é unânime no reconhecimento de uma maior frequência na emissão de sorriso por parte das mulheres e do seu uso mais contido e controlado por parte dos homens. Este comportamento esperado para o género pode ter determinado estas escolhas”. Esta é uma área profissional em que a pessoa expõe a sua intimidade, assumindo que o corpo será a parte mais pública da nossa identidade, a face neutra ou um sorriso mais empático e afectuoso é preferido a manifestações mais enfáticas”, explicou.
Dissecar assim o sorriso dos profissionais de saúde pode ter aplicação prática, tanto mais que a comunicação não verbal, é uma ferramenta de trabalho poderosíssima. “Como o uso de qualquer ferramenta, pode ser aprendida e treinada”, garante a investigadora, que acrescenta: “sabemos que o que dizemos às pessoas é importante mas também sabemos que mais importante é a forma como dizemos e a congruência que colocamos no acto de comunicar”.
Se um primeiro contacto se iniciar com o sorriso estará a transmitir-se ao doente a certeza de que há disponibilidade para uma relação de proximidade, “que terminará certamente, numa relação terapêutica eficaz com menor ansiedade e maior adesão ao plano terapêutico”, justifica. Ora isto poderá traduzir-se em coisas concretas “como por exemplo menos dor, menos complicações pós-operatórias, menos medicamentos ou altas mais precoces”.
Publicado em 'O Informativo'.
Sem comentários:
Enviar um comentário